Stereolab caça MPB de qualidade no Rio

Banda inglesa, que está fazendo sua primeira turnê brasileira, aproveita tempo livre para comprar discos de Marcos Valle, Nara Leão, Gal Costa e Elizeth Cardoso

Silvio Essinger
18/08/2000
Banda inglesa chega ao Rio de Janeiro. Na sua primeira manhã na cidade, o tempo está nublado. Qual o programa? Ir ao Centro para comprar LPs antigos de MPB. Pois foi isso que o Stereolab, festejado nome do cenário internacional do pop alternativo, fez hoje de manhã, horas antes de subir ao palco do Cine Íris (ao lado das bandas cariocas Pelvs, Stellar e 4 Track Valsa), como grande atração do festival Algumas Pessoas Ainda Tentam..., organizado pelo selo fonográfico Midsummer Madness.

Fundado no começo da década de 90 pelo guitarrista e tecladista Tim Gane e a vocalista francesa Laetitia Sadier, o Stereolab se notabilizou por uma sonoridade que combina elementos da música pop dos anos 60 (principalmente a lounge music e as trilhas sonoras) com a música eletrônica alemã dos anos 70 (o krautrock de Can, Neu! e Kraftwerk) e algumas pitadas de jazz. A música brasileira comparece discretamente na receita, em toques meio jazzísticos que remetem ao trabalho de Marcos Valle e João Donato.

Estes são os músicos brasileiros favoritos de Tim Gane, o mais enfronhado em MPB dos integrantes do Stereolab. Dono de uma coleção que, entre LPs e CDs, reúne "uns 75 a 78" títulos só de música brasileira, ele elogia o trabalho de Valle, do qual diz ter boa parte dos discos. "Seus arranjos são brilhantes e muito imaginativos. É um outro nível: eles paracem fáceis de se fazer, mas são muito complexos", diz. Recentemente, Gane adquiriu o disco com a trilha que o músico fez para o filme O Fabuloso Fittipaldi (tocado pelo Azymuth). Já do sebo carioca, o Classic Discos (que fica num sobrado da Rua Sete de Setembro), levou orgulhoso a cópia em CD de seu último disco, Nova Bossa Nova. "Espero que Marcos Valle o autografe para mim", diz.

A bossa, no entanto, não está entre as predileções de Gane. Sua grande fixação é a Tropicália, dos trabalhos de Caetano Veloso ("principalmente os ao vivo"), dos Mutantes (uma de suas outras compras foi o recém-lançado CD Tecnicolor, com o "disco perdido"da banda, gravado em Paris em 1970) e de outro grande ídolo, o maestro Rogério Duprat. "Ele fez arranjos muito incomuns, que têm uma coisa meio decadente que é muito boa. Compro tudo dele que acho", diz. Por conta da admiração pelo maestro, Tim chegou a Nara Leão. No sebo, por sinal, comprou dois LPs da cantora: Manhã de Liberdade (1966) e Os Meus Amigos São um Barato (1977). Feliz com as aquisições, ele conta que hoje em dia está cada vez mais difícil comprar LPs de música brasileira: "Eles estão todos nas mãos dos negociantes."

Foto: Rodrigo Lariú
Simon (esq.), Tim, Morgane e Mary com suas aquisições
Foto: Rodrigo Lariú
Mas não foi só Tim Gane que saiu com sacolas do sebo. O baixista Simon Johns arrematou um Índia de Gal Costa e uma coletânea da fase bossanovística de Eumir Deodato – por incrível que pareça, a favorita de Gane. Fã de Joyce, a tecladista francesa Morgane Lhote, por sua vez, arrematou um Paulinho da Viola de 1971 (que tem Para Ver as Meninas). Já a tecladista australiana Mary Hansen levou um compacto com músicas do LP de Elizeth Cardoso, Zimbo Trio e Jacob do Bandolim, gravado ao vivo em 1968, no Teatro João Caetano. "Meu pai, que morou no Brasil nos anos 60, tinha esse LP", conta ela. Só o baterista Andy Ramsey resolveu comprar um disco de um americano, o cantor Bobby Womack.

O Stereolab fez seu primeiro show brasileiro na quarta-feira passada, em Belo Horizonte. Depois do Rio, a banda segue para o Chile e a Argentina. Volta ao Brasil na semana que vem e faz dois shows na quarta e na quinta, dias 23 e 24, em São Paulo, no Sesc Pompéia. Em breve, a gravadora mineira Motor Music faz o primeiro lançamento brasileiro de um disco do Stereolab: o EP The First of the Microbe Hunters, que saiu há poucos meses no exterior.