Arnaldo Antunes em paz com o sucesso

Prestes a completar 40 anos de idade, o ex-titã comemora o fato de poder alternar seus discos de carreira com projetos menos comerciais, como trilha para balé do Grupo Corpo e coletânea de escritos

Silvio Essinger
28/08/2000
No próximo sábado, dia 2, o ex-titã Arnaldo Antunes completa 40 anos de idade. "Por coincidência ou não", como ele diz, em entrevista por telefone a CliqueMusic, alguns dias depois vai estar lançando o livro Quarenta Escritos (Editora Iluminuras), uma coletânea de textos seus publicados esparsamente, em jornais e revistas, ao longo dos últimos 20 anos. Com quatro discos solo lançados pela BMG (e mais um a caminho), ele tem muito o que comemorar neste aniversário, além, é claro, do lançamento de mais um livro.

De 1991, quando deixou os Titãs, para cá, Arnaldo conseguiu uma posição rara no cenário pop nacional: ao mesmo tempo em que mantém uma considerável popularidade como artista pop, tem autonomia para dedicar seu tempo a projetos paralelos de caráter menos comercial. Um deles foi a trilha (lançada em CD independente) do mais recente espetáculo de dança do Grupo Corpo, de Minas Gerais. O Corpo, que estreou em São Paulo no último dia 9, inicia temporada no Rio nesta quarta-feira, dia 30, no Theatro Municipal, com a presença do músico na platéia.

"Às vezes fico achando que meus discos poderiam alcançar mais espaço", confessa Arnaldo. "Meu público cresce um pouquinho a cada disco. É tudo muito devagar, mas está bom do tamanho que está, me garante uma solidez para dar o próximo passo." Até o fim do ano, ele entra em estúdio para gravar seu novo disco para a BMG. "Estou compondo e escolhendo um direcionamento para a sonoridade", adianta. Pela primeira vez, o ex-titã será produzido por Dudu Marote (que antes só havia assinado o remix de uma música sua). "Gosto de alguns discos que ele produziu, como os do Skank e do Pato Fu", diz.

Nas gravações, ele contará com participação de seus escudeiros de sempre: o guitarrista Edgard Scandurra, o baixista Paulo Tatit, a tecladista Zaba Moreau, o violonista e produtor Alê Siqueira e o percussionista Guilherme Kastrup. Não haverá mudanças na orientação que imprimiu à sua carreira solo, iniciada em 93 com o disco Nome. "Minha intenção é ser um artista pop. Só que faço muita coisa diferente – disco, livro, exposição... Tenho uma dificuldade com a idéia de especialização", conta.

Canção, só de raspão
Ao ser convidado pelo Grupo Corpo para compor a trilha de um de seus espetáculos, Arnaldo sentiu-se tentado pelo desafio – era a primeira vez que compunha para dança. Além do mais, antes dele Tom Zé e João Bosco haviam feito trilhas para espetáculos do grupo – respectivamente Parabelo e Benguelê. "Aceitei o convite com muito prazer, porque é uma companhia que eu admirava muito, de alta qualidade, com uma síntese de arte e técnica", diz o músico. Trabalhando "com toda a liberdade", ele acabou produzindo uma trilha que "tangencia a linguagem da canção". "Muita coisa lá não se enquadra no formato de canção", diz. "É uma peça de 42 minutos. Procurei fazer as mudanças entre os vários momentos sem que se pudesse perceber."

Em O Corpo, Arnaldo pôde experimentar à vontade em seu estúdio, o Rosa Celeste. "Sentia falta de um conceito. Pensei então no corpo, matéria-prima da dança. É um tema recorrente nos poemas que eu escrevo", diz. De cara, ele sampleou sons emitidos pelo próprio organismo – como grunhidos, gritos, roncar de barriga etc. – e os misturou a outros obtidos de forma eletrônica. "Minha maior intimidade é com o ProTools (programa de edição musical), que me possibilita fazer um corte-e-costura de sons", diz. Arnaldo também trabalhou com superposição de vozes, explorando seus efeitos rítmicos – uma experiência que promoveu de forma mais radical em 1997, no disco que acompanha o livro de poemas 2 ou + Corpos no Mesmo Espaço. Além da sua própria voz, escalou as de Mônica Salmaso (para os momentos mais melódicos) e de Saadet Turkoz. Com elementos de música indígena brasileira, O Corpo é uma trilha que Arnaldo considera ao mesmo tempo tribal e eletrônica.

Apesar de ser um projeto paralelo e especial ("por ser uma trilha, e não um disco de canções"), Arnaldo não faz diferenciações para O Corpo: "É como qualquer um dos outros discos que lancei." Para quem quiser conseguir o CD, o jeito é procurar onde o espetáculo do Corpo estiver sendo encenado. Ele fica em cartaz do dia 30 a 4 de setembro no Rio, dos dias 6 a 10 de setembro em Brasília (no Teatro Nacional) e dos dias 13 a 18 em Belo Horizonte (no Palácio das Artes).