MALANDRO É MALANDRO E MANÉ É MANÉ
Bezerra da Silva (2000)
Crítica
Cotação:
Muito antes do gangsta rap americano e do próprio hip hop nativo, o partideiro Bezerra da Silva já transmitia do outro lado da fronteira da guerra civil não declarada do país. Aos poucos, o pernambucano proveniente da escola do coco (a mesma de Jackson do Pandeiro) foi afiando o repertório colhido entre autores anônimos (alguns clandestinos) nas bibocas e tendinhas da periferia carioca até transformar-se num clássico, regravado do Barão Vermelho ao Rappa. Trocando mais uma vez de gravadora, Bezerra mantém a metralhadora (dos autores que escolhe) calibrada na direção dos poderosos com críticas sociais cada vez mais certeiras como as de Medo de Virar Galeto ("todo dinheiro gasto pelo homem/ comprando arma para a guerra que só traz a dor/ daria para matar a fome de todo o povo sofredor ") ou Muro da Verdade ("vítimas da adversidade/ que a elite tão selvagem/ vê e finge que não vê/ somos fruto de um regime/ que soma sem dividir"). A diferença entre seus petardos e os do povo hip hop está no humor sarcástico (vide a faixa título e Papo de Malandro) em defesa da malandragem no samba, que vem de Ismael Silva e Noel Rosa a Wilson Batista, Geraldo Pereira e Moreira da Silva. Como a vida piorou na área, acabaram-se as sutilezas, como em Campo Minado ("o braço direito do cara/ tá de cara feia olhando a tua cara") ou Tua Batata Tá Assando ("não fui na polícia, seu cara de bode/ quero ver se você vai fazer o mesmo/ quando eu lhe der um tremendo sacode"). Mas além da debochada Tem Coca Aí na Geladeira, que deve (literalmente) puxar o disco, Bezerra também manda (em parceria com a mulher, Regina) sambões de dor de cotovelo (Só Não Posso Dar o Céu, Eu Fingia Lhe Querer) e acena aos paulistas mapeando as delegacias locais Os D.P.s de São Paulo (Capital) ou mandando o samba enredo sintomático Zona Leste Somos Nós, da tradicional escola Nenê de Vila Matilde. Ele sabe que periferia é periferia, em todo lugar.(Tárik de Souza)
Faixas